A Paca “Chumaqui” (Por Coronel José Luiz Barros)

Por José Luiz Barros

CAUSOS DE SANTO ANTÔNIO DO MUQUI

O “seu’ Antônio Gavola costumava dizer que só tinha três condições para o caboclo macho se curvar: diante da cruz de Cristo, na frente do “homem da capa preta” (juiz) e debruçado sobre o balcão de uma venda tomando pinga.

Era exatamente nesta última situação que se encontrava o Gavola, mas o pessoal da venda do Berg já sabia que quando ele aprumava o corpo era sinal pra todo mundo fazer silêncio porque lá vinha nova história, e não deu outra: “pescador é tudo mentiroso!” falou ele já com a voz meio pastosa.

O pessoal se aquietou e ele continuou: “Outro dia fui a Mimoso na casa de um pescador chamado “Aniba”, lá na rua da igreja, e quando cheguei vi que nas paredes tinha um monte de desenho de peixes. Perguntei a ele que peixe era aquele menorzinho e ele falou que era uma piaba. Cruz credo seu Aniba, pelo tamanho do desenho deve de ter pesado meio quilo! Apontei pra outro desenho e ele disse que era uma acará que foi pescada lá perto da ponte do “Dr Linco”. Parecia ter um quilo.

Falei pra ele com toda sinceridade e respeito que achava aquilo uma barbaridade. Foi aí que ele me explicou: “eu chego da pescaria já à noitinha e antes de limpar o peixe eu venho aqui pra sala, acendo a lamparina que está em cima da mesa, seguro o peixe pelo rabo com a mão esquerda e com um carvão na mão direita sigo o desenho do peixe que aparece na parede”. “Piaba de meio quilo”… desdenhou ele.

Já caçador não mente… Outro dia encontrei lá no bar do João Bonze dois caçadores amigos meus que estavam numa prosa animada a respeito de uma paca que tinha lá pras bandas da Areia Branca. Diziam que a paca corria igual aquele moço lá do estrangeiro que corre corrida de carro e até por isso botaram apelido nela de paca Chumaqui (Schumacher). Ela aparecia lá na borda da mata e parecia debochar deles.

A cachorrada saía em desabalada carreira atrás dela pra voltar tudo humilhado depois: babando e com um palmo de língua pra fora. Ninguém conseguia pegar aquela paca.

Fui pra casa, depois de passar aqui pela venda do Berg, e fiquei matutando um jeito de pegar aquela desaforada. Depois de uns dois meses achei uma solução. Ficamos eu, Filante e Filó, meus cachorros de caça e estimação, treinando por mais de um mês, pois não podia ter erro nessa empreitada. Num determinado dia lá fomos nós pra Areia Branca atrás da paca ligeira que tinha desafiado os caçadores de lá.

Ficamos na tocaia até que no cair da noite lá estava ela… acho até que ela estava com um sorriso de deboche na cara.

Iniciei, então, nossos preparativos: chamei Filante, que era mais experiente, pra iniciar a corrida; o Filó eu peguei e coloquei nas costas do Filante com a barriga e as pernas voltadas pra cima; com as tiras de borracha de câmara de pneu que me foram dadas pele Tão Borracheiro lá de Mimoso, amarrei os dois cachorros pela barriga de forma que enquanto o de baixo corria, o outro descansava no bem bom de barriga pra cima. E foi dessa forma que caçamos a paca Chumaqui. Quando eu percebia que Filante cansava eu gritava: TROCA!! Aí o cachorro que estava embaixo ia pra cima descansar. E assim foi: TROCA… TROCA, até que a paca não aguentou mais e caiu durinha.

Tem até um pessoal que acha que a paca morreu foi de susto ao ver um animal tão esquisito, com oito patas, fungando no cangote lá dela.”

A turma da venda se agitou: “muito bem “seu” Antônio; muito inteligente! “Mas eis que de repente ouviu-se lá da porta: “Ô “seu” Antônio”, era Paulo Henrique, filho de Davi,” eu nunca ouvi dizer que paca morresse de infarto!”
Dito isso, nem esperou a resposta. Passou sebo nas canelas e saiu em desabalada carreira até levantar poeira lá na curva do ginásio.

O pessoal ficou meio constrangido e temeroso que alguma tragédia pudesse acontecer. Mas foi aí que o Berg, dono de venda matreiro, trinta anos de balcão, acostumado com os entraves da profissão, falou de uma forma a amenizar o ambiente: “aí “seu “Antônio, o Paulo Henrique correu mais que a paca Chumaqui, né??” Pronto! Restabeleceu-se a harmonia e alegria na venda…